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O VI Seminário Bienal de Estética e Crítica de Arte, “No Suor das Tempestades”, organizado
pelo Grupo de Estudo em Estética e Crítica de Arte (GEEC), sob coordenação do professor Dr.
Ricardo Fabbrini, será realizado de 12 a 14 de novembro de 2024, na FFLCH, Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, de forma híbrida, presencial e online.
As múltiplas faces do manifesto redigido por André Breton, em 1924, serão apresentadas e
distribuídas entre uma conferência de abertura e seis mesas temáticas que irão explorar neste
evento as vicissitudes geradas pelo Movimento como sequências e impasses, realizações e
questionamentos, afirmações e dúvidas inclusive sobre seu papel na Modernidade, fator que lhe
concede sua flagrante atualidade.
“No Suor das Tempestades” terá como particularidade debates sobre o “Surrealismo nos
Trópicos”, além de trazer para as comemorações do Manifesto, uma mesa dedicada à “Moda
Impossível”. Temas como, “Entre o Erótico e o Onírico”, o “Surrealismo Etnográfico” e
“Montagem Convulsivas”, uma mesa voltada para a fotografia e o cinema, pretendem reacender
o lado inquietante e implosivo do Manifesto.
“Surrealismo” foi o nome escolhido por André Breton e Philippe Soupault em homenagem a
Guillaume Apollinaire, a partir da contração da palavra ‘supernaturalismo’, retirada, por sua vez,
da dedicatória de Nerval para seu romance Les Filles du Feu (1854). Designa o horizonte
sintético de um programa vanguardista, onde a realidade deve ser superada pelo gesto artístico
(de onde se justificaria a aposta numa sur-realidade). Menos evidente, contudo, é sua existência
enquanto conflito. Se há um legado deixado por essa vanguarda que deteve o monopólio artístico
durante duas décadas, na então capital cultural do mundo, trata-se de sua inquietante presença,
consubstanciada pelas leituras contraditórias que nela se cruzam.
Relativamente indiferente aos imperativos da forma e às leis do gênero artístico, deliberadamente
literária e excessivamente visual (“A imagem é uma criação pura do espírito” – Première
Manifeste), “Surrealismo”, talvez, seja o nome apropriado para designar uma ambivalência
absolutamente produtiva, que perdura e alimenta dilemas e delírios do próprio contemporâneo.
Simultaneamente onírico e militante, erótico e traumático,“implosão metonímica e uma explosão
metafórica”, tal como se vê no célebre poema de Éluard (Liberdade, 1942). O desejo coletivo de
conclamar a liberdade é capaz de disseminar-se em todos os tempos e searas, nas “veredas
acordadas” e nos “refúgios destruídos”, nas “estações enlaçadas” e no “suor das tempestades”.
Considerando uma leitura do Surrealismo como realismo profundo de ré, o atual cenário
incandescente (fala do físico Carlos Nobre) insinuando a reversibilidade cultura/natureza, arte/
vida a desafiar os limites da subsidência é uma alerta cosmopolítica dos excessos surreais da
civilização. Faz sentido o que declarou Louis Aragon, anteriormente ao Manifesto, em um texto
chamado Uma vaga de Sonhos, do mesmo ano do Manifesto de 1924, quando se referiu ao
Surrealismo como evidência do nominalismo absoluto, de que não há pensamento fora das
palavras: “Aparência do fortuito, do arbitrário, que vem atingir nossos sentidos, despojando-se
do aspecto verbal para assumir as modalidades fenomenais que sempre tínhamos pensado ser
impossível provocar, fixas, fora de nossa fantasia.”
Segundo Aragon, no mesmo texto: “O surrealismo inteiro sustentou essa proposição que encontra
ainda hoje incredulidade nas vagas opiniões incessantemente desmentidas pelos fatos dos
realistas conduzidas pelas belas noites chuvosas, ao Panteão”.